Walber Guimarães Junior
Donald Trump e Jair Bolsonaro em paralelo pela pista da direita.

Qualquer observador mais atento, desprovido de paixão política, consegue rapidamente estabelecer um paralelo entre as estratégias, ações e confrontos de Donald Trump e Jair Bolsonaro, adaptados aos cenários de ambos os países. Muito justo que se conclua que esta identidade decorre da mesma visão de mundo, com ideologia conservadora, nacionalista, populista e que questiona instituições e situações que não se ajustem à suas agendas.
Vamos aos fatos.
Recuando à pandemia do início da década, ambos minimizaram a gravidade da Covid 19, desconsideraram orientações científicas e promoveram tratamentos sem comprovação, como a cloroquina.
Ambos entraram em conflito com equipes de saúde pública e testaram medidas para reabrir a economia rapidamente, desafiando autoridades locais e setoriais. Foi uma aposta arriscada que representou um custo razoável para ambos.
Donald Trump e Jair Bolsonaro também andaram em paralelo na mobilização de eleitores em torno de pautas conservadoras, armamento da população e política de oposição à política de gênero e direitos LGBTQIA+, sendo para ambos, pontos de convergência para as bases religiosas e conservadoras, elementos centrais do peso eleitoral de ambos.
A política ambiental é mais uma pauta que apresenta o mesmo padrão de comportamento com intensa oposição aos especialistas e desapego às instituições. Trump abandonou o Acordo de Paris e Bolsonaro além de incentivar a exploração de áreas de conservação, combateu quase todos os órgãos de fiscalização, como IBAMA e ICMBio.
A redução significativa de investimentos em pesquisa e o descaso à ciência é outro traço comum, com ambos promovendo profundos cortes nas verbas de pesquisas e orçamento das universidades, com inúmeros episódios de descrédito da ciência, em especial na área da saúde.
Evoluindo até a questão mais drástica, há um evidente paralelo entre o 6 de janeiro de 2021 americano e o 8 de janeiro de 2023 brasileiro porque ambos mostram apoiadores extremados, com estímulo dos líderes, protagonizando ataques a prédios públicos e instituições nacionais, com claro propósito de negar o resultado das eleições, em ambos os casos com consequências políticas e jurídicas severas, embora a reação do Judiciário brasileiro se mostre muito mais efetiva que a leniência das instituições americanas que se curvaram ao sabor das conveniências, sendo esta, provavelmente, uma das razões que impulsionam a solidariedade de Trump ao correligionário sul americano.
O conjunto destas ações mostra um padrão único de populismo, polarização e contestação às instituições democráticas, com declarações e atitudes que remetem ao risco da independência dos poderes e da democracia como valor absoluto.
A despeito de tantas evidências de uma estratégia global da direita mundial, inclusive porque, em menor grau, este quadro se repete em outros países, é preciso entender que as razões econômicas superam de longe as questões ideológicas, embora mais evidente em Trump, julgo que as pautas ideológicas radicais se prestam muito mais ao papel de “fechar o time”.
Interpretando a postura de Eduardo Bolsonaro, ponta de lança da direita em território americano, a falta de perspectiva na batalha judicial o conduz à atitudes extremadas, praticamente um tudo ou nada, colocando a possibilidade de interferência americana como atalho único que garanta a liberdade e até mesmo os direitos eleitorais de Bolsonaro, sendo razoável que esta seja a linha condutora das ações da extrema direita brasileira, com foco muito mais intenso nas questões individuais do que em qualquer raciocínio razoável que justifique a busca de apoio externo para promover desajustes na economia e em muitos setores produtivos do Brasil, quase todos muito próximos do ex-presidente, como se apontasse para um hara-kiri político.
Todavia, entender Donald Trump exige que se adote como premissa a sua total prioridade aos fatores internos.
Para Trump, a aldeia global é apenas uma ficção e seu universo se encerra nas fronteiras americanas porque a cena externa apenas se presta ao papel de produzir divisas para os americanos.
Registro que estou entre os que desaprovam a falta de apetite de Lula para o necessário diálogo direto com Trump, ainda que eu esteja convencido que as pressões internas, de produtores e da população em reação à inflação são as possibilidades mais reais para estimular tarifas mais suaves no comércio entre as nações.
Nada autoriza desconsiderar a soma de fatores diversos; ameaça de desdolarização, ação mais agressiva dos Brics, o pix que incomoda no médio prazo o sistema de crédito americano e principalmente a reação brasileira às bigtechs, instrumento fundamental no jogo de poder desenhado pela direita mundial, mas é fundamental ter em mente que, ainda que o paralelo traçado entre Trump e Bolsonaro seja efetivo, na cabeça laranja do homem mais poderoso do mundo as prioridades atendem a outra lógica.
O homem de negócios Donald Trump, neste momento investido do cargo de presidente americano, jamais colocará razões ideológicas à frente dos resultados econômicos.
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