Nova bomba de combustível será obrigatória

Na semana passada, a maior operação já realizada contra o crime organizado no setor de combustíveis revelou algo que, para muitos motoristas, era apenas desconfiança: fraudes em postos vão muito além de gasolina batizada ou desconto duvidoso.
Nomeada de Carbono Oculto, a força-tarefa envolveu 1.400 agentes de diferentes órgãos e atingiu 350 alvos em oito estados.
O esquema fraudulento, ligado ao PCC, movimentava bilhões em sonegação, lavagem de dinheiro e adulteração de combustíveis e bombas de abastecimento.
Uma das fraudes identificadas em postos que, segunda a polícia, seriam controlados pela facção criminosa é o chamado "golpe da bomba baixa", que consiste em modificar o equipamento para que forneça menos combustível do que a quantidade informada no respectivo painel.
Um novo tipo de bomba, que já está ganhando espaço nos postos, é virtualmente imune a esse tipo de golpe. Trata-se da bomba medidora criptografada, tecnologia brasileira que será obrigatória nos postos de todo o Brasil a partir de 2029.
Hoje, três fraudes principais rondam o abastecimento: a sonegação de impostos (que foi parcialmente cercada com mudanças na tributação do setor), a adulteração do combustível (com adição irregular de substâncias como metanol) e a fraude na medição do combustível - justamente a mais difícil de ser detectada. É essa última que a nova bomba previne.
O golpe da "bomba baixa" funciona assim: chips ou dispositivos eletrônicos são instalados para manipular os pulsos de medição entre o medidor e o visor da bomba.
Na prática, o visor mostra 40 litros, mas o tanque recebeu menos. O motorista paga o valor informado no painel, sem perceber que foi enganado.
As bombas criptografadas impedem esse tipo de interferência. Elas contam com assinatura digital inviolável, que valida cada abastecimento com um "carimbo" eletrônico.
Se houver qualquer tentativa de adulteração, a bomba trava ou exibe uma mensagem de erro.
A tecnologia ainda permite monitoramento remoto, tem memória inviolável e impede o acesso aos cabos de automação, os pontos mais visados por fraudadores.
Como saber quais postos já têm nova bomba
Em São Paulo, essa tecnologia já está presente em 171 postos do estado (sendo apenas 15 na capital) com um total de 445 bombas instaladas.
Uma campanha, batizada de Bomba Segura, liderada pelo Ipem-SP (Instituto de Pesos e Medidas), criou uma ferramenta para o consumidor identificar onde estão os postos que oferecem esse tipo de proteção.
O painel interativo está disponível no site do Ipem e permite buscar por cidade quais locais já têm bombas criptografadas e certificadas conforme as regras do novo regulamento técnico metrológico.
"Por meio do serviço disponibilizado pelo Ipem-SP, os consumidores podem acessar informações sobre quais postos de combustíveis em São Paulo passaram por esse processo de verificação.
Essa transparência permite que o consumidor faça escolhas mais seguras, optando por locais onde as bombas foram verificadas e aprovadas pelo Ipem-SP, garantindo que o volume de combustível adquirido seja o mesmo que está sendo pago", explica o superintendente do instituto, Marcos Heleno Guerson de Oliveira Junior.
Quanto custa a bomba criptografada
Trocar uma bomba tradicional por uma com tecnologia antifraude tem custo mais alto, mas, segundo Emerson Kapaz, presidente do Instituto Combustível Legal, não é algo inviável.
O custo fica entre 20% e 30% acima do valor cobrado pelo aparelho antigo, informa.
O setor discute alternativas para facilitar essa transição, incluindo linhas de financiamento pelo BNDES.
A implementação da nova bomba é gradual, com prazo até 2029 para que todos os postos adotem o equipamento criptografado.
Para o consumidor, isso significa que a presença da nova bomba ainda é exceção - por isso, saber como se proteger mesmo em postos sem essa tecnologia continua sendo essencial.
Emerson Kapaz, presidente do ICL, destaca algumas atitudes simples que ajudam a evitar prejuízos, especialmente enquanto a nova tecnologia ainda não está presente em todos os postos:
- Desconfie de preços muito abaixo da média. Diferenças de R$ 0,60 ou mais entre postos próximos geralmente não têm explicação razoável.
Evite promoções que só aceitam dinheiro ou pagamentos por apps pouco conhecidos. Isso pode indicar tentativas de escapar do sistema oficial de cobrança.
Sempre peça nota fiscal. Ela é sua prova em caso de problemas no motor ou denúncia por combustível adulterado.
Verifique o selo do Inmetro (Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade ou Tecnologia) ou do Ipem na bomba. Ele deve estar visível e com o ano vigente. É a garantia de que aquela bomba passou por verificação recente.
Se desconfiar, exija o teste da medida-padrão de 20 litros. O posto é obrigado a ter esse equipamento, lacrado pelo Inmetro, para comprovar a precisão da medição.
Emerson Kapaz explica que, muitas vezes, o posto que frauda de um jeito, frauda de outros também.
Por isso, ao notar algo suspeito - como promoções que evitam registrar a venda, especialmente com pagamento em dinheiro vivo, é melhor evitar.
A chance de você pagar por mais combustível do que realmente recebeu, e ainda levar produto de qualidade duvidosa, é grande.
Outro ponto importante reforçado pelo executivo é que o crime no setor de combustíveis se adapta.
Quando a sonegação foi cercada com a cobrança antecipada de impostos, os fraudadores passaram a focar adulteração química e manipulação de bombas.
Com o avanço da bomba criptografada, a tendência é de que novas brechas sejam buscadas, por isso, a fiscalização precisa ser constante e inteligente.
A bomba criptografada não resolve tudo.
Ela não tem impacto na qualidade do combustível - esse controle é feito pela ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis) -, mas representa um passo importante contra um tipo de golpe que o consumidor não tem como perceber.
É o começo de uma mudança que pode, aos poucos, mudar a lógica de desconfiança que ainda ronda os postos brasileiros.
"Quando um posto investe nessa bomba, ele está dando um recado claro ao consumidor: aqui, você recebe o que pagou", diz Emerson Kapaz. Quanto mais motoristas passarem a procurar por essa segurança, maior será a pressão para que a nova tecnologia se espalhe.
COMENTÁRIOS